Foto: Corbis
Imagine não conseguir se expressar por causa da gagueira ou, então, sua voz ser objeto de deboche, a ponto de lhe impedir de trabalhar, se relacionar e viver uma vida normal. Parece terrível, não? Se você não sofre de nenhum distúrbio vocal, não faz ideia do drama que milhões de pessoas enfrentam todos os dias devido a alterações na voz e na fala. Além da gagueira, que atinge 1,6 milhões de brasileiros, de acordo com dados da Associação Brasileira de Gagueira, outros distúrbios, como voz excessivamente fina em homens, fanha ou aguda demais e rouquidão, podem se tornar verdadeiros pesadelos. O que muita gente desconhece, no entanto, é que não é preciso conviver com esses problemas: o tratamento é rápido, eficaz e mais simples do que se pensa.
Quem afirma é o fonoaudiólogo Simon Wajntraub, que, desde 1968, já tratou cerca de mil pessoas, acometidas pelos mais variados distúrbios vocais. Em todos esses anos de consultório e curso de oratória, presenciou diversos casos em que os pacientes abandonaram os estudos e o trabalho para viver reclusos em casa, por conta da vergonha de gaguejar; homens que não conseguiam evoluir no trabalho nem conhecer mulheres por causa da voz demasiadamente fina e crianças que sofriam bullying no colégio, entre outras situações. O especialista explica que os problemas vocais atrapalham principalmente quem trabalha diretamente com o público, razão pela qual tem entre seus pacientes diversos atores, músicos, advogados e executivos do alto escalão.
A maioria dos problemas da voz e da fala, segundo o fonoaudiólogo, decorre do tratamento que o paciente recebeu da família na infância. “O tipo de voz é assimilado pela convivência. O mimo dos pais, por exemplo, de falar com a voz fina ou infantilizada com os filhos, acaba fazendo com que eles fiquem com a voz melosa, afeminada ou esganiçada. O hábito de falar alto demais também: se a criança vive em um ambiente barulhento e todos na casa falam em altos brados, ela também falará”, explica Simon. Outra questão que ele relaciona à criação familiar é a timidez e a voz excessivamente baixa e/ou fina, geralmente resultado da criação por pais repressores e autoritários.
Outros distúrbios, como a voz anasalada e a rouquidão, costumam ter origens orgânicas e, portanto, mais sérias. “Casos de voz fanha, com omissão e troca de letras, se devem a malformações como lábio leporino e fissura palatina. Quando a criança nasce com um desses problemas, são necessárias cirurgias plásticas de correção e tratamento fonoaudiológico para que a pronúncia das palavras ocorra corretamente. Já a voz rouca, por sua vez, normalmente se inicia por um processo emocional, traumático ou não, e com o tempo vai ser tornando orgânica devido ao uso incorreto da colocação vocal”, diz o especialista, lembrando que o problema é muito comum em profissionais que trabalham utilizando a voz sem impostá-la corretamente, como professores e locutores.
Para a correção rápida dos distúrbios vocais, Simon faz uma análise minuciosa da fala do paciente, com o objetivo de chegar ao posicionamento certo da voz. A partir daí, ensina a maneira correta de pronunciar as sílabas e passa exercícios e um material audiovisual para que a pessoa possa treinar, a fim de fixar e aprimorar a técnica. “Depois disso, o paciente participa, então, das aulas de oratória em grupo, para treinar a fala em situações de estresse e, assim, perder a inibição e manter o tom certo da voz. O carro chefe é a argumentação sob pressão”, conta o fonoaudiólogo.
A dica mais importante que o especialista dá para quem tem problemas vocais é procurar ouvir a própria voz, seja num sistema de retorno (fone de ouvido ligado a um microfone) ou por meio de uma gravação em vídeo. Ele explica que as pessoas não conseguem reconhecer a própria voz quando ouvem uma gravação, porque a ouvem de forma diferente internamente, por isso é importante escutar como a voz é realmente para ver de que forma é preciso impostá-la e quais exercícios são necessários para melhorá-la.
“Como a maioria dos casos de alterações vocais tem fundo emocional, é importante que a pessoa possa de fato ouvir a sua voz para se liberar de censuras e limitações e, assim, passar a trabalhar todo o seu potencial vocal impostando a voz no tom certo, ou seja, a faixa de frequência onde a voz flui bem e sem esforço excessivo”, explica Simon, lembrando que, no caso das pessoas que sofrem de rouquidão, pode ser necessário acompanhamento de um otorrinolaringologista, para que o médico verifique a existência de problemas vocais.
Para ajudar quem tem a voz muito fina, baixa ou alta, o fonoaudiólogo indica um exercício simples: “o modo mais prático é procurar falar em diferentes tons de voz através da pronúncia de uma mesma palavra de modos diferentes, desde o tom mais grave até o mais agudo. Em seguida, fazer isso com a pronúncia de uma frase. Quando encontrar o tom em que notar que não fez muito esforço para pronunciar a frase com a voz mais encorpada, esse será o tom certo da sua voz”
Outro conselho importante do especialista para os pacientes que falam baixo demais é que tentem se soltar mais, adotando uma postura mais extrovertida e extravasando os sentimentos em voz alta. Ele chama atenção, também, para a necessidade de os pais criarem um ambiente comunicativo em casa, onde as crianças tenham liberdade de falar e se expressar livremente. “Assim elas aprenderão a impostar bem a voz e a ter autoconfiança, que é o que falta em boa parte dos pacientes que chegam ao consultório com distúrbios vocais, e se sairão melhor ao construir relacionamentos e iniciar a carreira profissional”, diz o fonoaudiólogo Simon Wajntraub.